sexta-feira, 22 de junho de 2007


O que falta aos olhos de todos é a percepção detalhista do Todo. A observação do constante, daquilo que nunca muda. Quer ver? Faça um teste. Amanhã, ou depois, dependendo da sua disposição em tornar o Simples diferente, ande pela rua como se nunca tivesse visto asfalto. Pessoas? Você nunca as viu e tampouco sabe defini-las. Olhe para os gigantescos prédios ao redor. Tente imaginá-los de outro ângulo (veja-os de cima, por exemplo). O carrinho de pipoca deve virar uma nave intergaláctica ou uma mão amarela e grande. Você não está usando seus pés. Apenas desliza, sinta cada coisa, perceba as cores de tudo. Talvez o céu fique cinza-chumbo ou vermelho-pitanga. Sente na praça menos movimentada. Observe as ações, os gestos, os toques, os sentimentos. Entre nos olhos de todos, sem bater. O olho transmite-nos uma infinidade de possibilidades. Tente imaginar o que se passa ali. Perceberá que inconscientemente esboçará um leve sorriso, ou um pequeno desprezo. Não se assuste, acontece com todo mundo que tenta fugir do igual.
Experimente isso uma vez. Se gostar, faça de novo. Crie o hábito de não aceitar as coisas apenas como elas são. Defina-as como você queira. A autonomia é o que faz um João se tornar Glauberton da Silva. Use-a sem pudor. Triângulo? Três lados e três ângulos. Isso é o que dizem, mas você prefere assim? Triângulo é som de caboclo, instrumento de corte, vara de pescar, anel pra caçar estrelas e dar à amada ou piso de burguês.
A profissão de fé do cronista é sentir o mundo da sua maneira. É sentir tudo isso. Céu vermelho-pitanga, triângulo sonoro, mão amarela. É fugir de si e encontrar-se no universo. Abraçar o pó e dele fazer serenata literária. Experimenta.

quinta-feira, 21 de junho de 2007




Sapato ao encontro do chão. Repetidas vezes. Seguindo o ritmo.
Tamanco ao encontro do chão. Repetidas vezes. Tentando seguir o ritmo.
Quadril balançando. Uma dança dentro do corpo.
Mão no bolso. Seguindo o ritmo, um bem tímido.
Cabeça em movimentos leves. Pra frente, pra trás.

E assim todos ficaram envolvidos com o som daquela banda. As raízes do interior, que, querendo ou não, possuíam.


Do sujeito mais sério à secretária extrovertida. Talvez aquele tenha sido o único momento do dia onde essas pessoas puderam extravasar, sentir-se vivas, balançar-se. Não houve quem os criticasse, afinal, todos entendiam aquele filme, entendiam o que estava acontecendo naquele lugar.
Adoro essa época do ano. São João. Não que eu me encante com a fogueira ou as comidas típicas. Pelo contrário, pé-de-moleque pra mim é pedofilia. Mas essa época serve como uma revolta silenciosa. Uma vitória sobre a pobreza dos gostos alheios. É uma forma de mostrar que o forró da nossa ascendência prevalece, e assim continuará, sobre o cuspe que o Ceará gerou: o forró eletrônico.
Letras imundas, pífias, sem a menor melodia ou poesia. Assim é como encaro o forró criado nessa última década. E não venham com argumentos contrários, pois a dialética não deve ser usada em temas vãos. Uma indústria que alimenta meia dúzia de empresários às custas do atrofiamento cultural de nosso povo. Cultura esta que poucos trataram de alavancar.
A sorte é que em nossas veias ainda corre a figura do sertanejo com a sua sanfona. Nossos ouvidos, mesmo sem querer, ainda escutam a bela melodia proveniente do triângulo. Nossa orquestra modesta e majestosa ainda toca, incansavelmente, harmoniosos sons aos nossos corações. E aí, balançamos nossos pés e mãos. Percebemos como nossa música é forte e persistente. Damos um suspiro de alívio.

Viva o forró da origem,
viva o pé-de-serra,
viva Luiz Gonzaga,
viva Sivuca
viva o ritmo inconsciente do nordestino em contraposição ao ritmo inconseqüente do Felipão.



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“Jesus abençoou com sua Mão Divina,
pra não morrer de saudade vou voltar pra Petrolina...
Petrolina... Juazeiro
Juazeiro... Petrolina ”

(Petrolina Juazeiro - Almir Rouche)